sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Sessão "Relações familiares" no Cineclube Nangetu

Cineclube Nangetu
Sexta-feria, dia 7 de setembro, 19h.
Tv. Pirajá, 1194 - Marco.
32267599

Perto de casa, de Sérgio Borges.

Relações familiares · Olhares introspectivos e relações afetivas
Ao escolher a família como seu foco primário de atenção, os sete curtas-metragens que compõem este programa voltam seu olhar para aspectos distintos deste que é o núcleo fundador da nossa sociedade. A família, com sua capacidade de resumir os principais conflitos e realizações do ser humano, serve de espelho para todos nós. Não por acaso, assistindo a estes filmes, que ganharam prêmios e participaram de diversos festivais nacionais e internacionais, podemos ver projetadas ali nossas próprias relações com pais, avós, irmãos, tios, filhos, maridos e esposas. Realizados entre 1988 e 2009, eles nos permitem ainda traçar um painel tanto dos modelos de organização e relações afetivas e familiares ao longo deste período, como também ver variações de modelos narrativos e de produção pelos quais o cinema passou nos últimos anos.

Filmes
  • Café com leite, de Daniel Ribeiro, , 2007
  • Depois das nove, de Allan Ribeiro, , 2008
  • História familiar, de Tata Amaral, , 1988
  • Laurita, de Roney Freitas, , 2009
  • O bolo, de José Roberto Torero, , 1995
  • Perto de casa, de Sérgio Borges, , 2009
  • Tempo de ira, de Gisella de Mello, , 2003

Família: todo mundo tem uma, cada um tem a sua
Eduardo Valente*

Presentes na vida de quase todas as pessoas, é apenas natural que as relações familiares sejam tema recorrente no cinema. No universo do curta-metragem, essa presença é ainda mais notável, pois a curta duração e os orçamentos mais baixos pedem uma capacidade de se dizer mais com menos, resultando muitas vezes em histórias que se resolvam num microcosmo que o espectador reconheça com facilidade – como o dos laços familiares. Por sorte, as famílias são infinitas em suas organizações, e inúmeras são as possibilidades narrativas a explorar dentro delas.
Tomemos Laurita, por exemplo, onde sobressai a centralidade da figura feminina no seio da família, sobrando para os homens um papel secundário. Enquanto a personagem-título faz a dura passagem de menina para mulher, o filme explora uma variedade de complexos laços entre as mulheres: mães e filhas, tias e sobrinhas, primas. Impressiona como o diretor consegue ao mesmo tempo dar personalidade a um número grande de personagens e solucionar sua trama na duração curta.
É o contrário do que acontece em História familiar e O bolo, que centralizam suas narrativas em um casal e um cômodo. No primeiro, a sala da casa serve de espaço para um balé de encontros e desencontros dos desejos conflitantes de um casal que, mesmo jovem, já tem uma estrutura estabelecida (a voz da filha em off mostra isso). Não é difícil imaginar aqueles personagens indo dar, décadas depois, no casal de O bolo.
Aqui, ao contrário da concisão temporal do primeiro (uma mesma noite), acompanhamos em elipse cenas de uma rotina na qual a agressão mútua parece a única forma de comunicação no espaço de uma cozinha.
São dois lados de um mesmo espelho: o carinho que não esconde o enfado; a agressividade que não mascara o amor profundo.
Depois das nove, de Alan Ribeiro.

A cozinha também surge em Depois das nove como espaço do convívio familiar. Nesse caso, porém, trata-se de um gentil conflito de gerações entre avó e neto, portanto essa partilha de um mesmo espaço não significa de fato que haja uma troca. Cada um tem os seus objetos, dos seus próprios tempos (um rádio de pilha aqui, um computador ali), e apenas um trauma poderá fazer com que eles se olhem de frente. Ao final, o filme parece sair da casa para respirar os ares do mundo. Também é da necessidade de se escapar da casa e ir ao mundo que fala
Tempo de ira. Só que aqui, em meio à opressiva paisagem aberta do sertão, a questão não é de arejamento, mas de fuga mesmo – ainda que uma fuga consentida, num gesto de sacrifício materno extremo.
Sacrifícios também precisam ser feitos em Café com leite, onde uma perda obriga os personagens a assumir papéis diferentes dos que tinham na família. De fato, nesse filme de 2007 vemos uma nova família que se forma, seja na reescritura dos laços entre irmãos, seja nos laços de sensibilidades e sexualidades – e, curiosamente, são as mulheres que se encontram ausentes.
Café com leite, de Daniel Ribeiro.

Também só há homens em cena em Perto de casa: na frente da câmera, onde dois irmãos estabelecem toda uma dinâmica entre o mais velho e o caçula; e atrás dela, de onde a voz do pai tenta impor limites e, ao mesmo tempo, partilhar do momento lúdico de diversão. Aqui a nova estrutura que se impõe não é tanto da família, mas da produção: com a disseminação da tecnologia digital, imagens são captadas “ao natural”, sem o compromisso de estar “fazendo um filme”. É um trabalho que dá, dentro deste programa, todo um outro sentido para a expressão “filme de família”.

* Cineasta, crítico e editor da revista eletrônica Cinética
(www.revistacinetica.com.br)

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